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Fazendas verticais internas. Elas são o futuro da agricultura?

 

Em 2050, a população global deverá atingir 9,8 bilhões. Como vamos alimentar todo mundo? Stuart Oda (*), banqueiro de investimento que virou fazendeiro, aponta a agricultura vertical interna como solução: cultivar alimentos em prateleiras escalonadas em um ambiente controlado e à prova do clima. Em uma palestra futurista, ele explica como esse método pode manter melhores padrões de segurança, economizar dinheiro, utilizar menos água e nos ajudar a cuidar das gerações futuras.

Vídeo: TED Ideas Worth Spreading

Tradução: Júlia Ogalha. Revisão: Raissa Mendes

A fazenda vertical, ou horta vertical (vertical farm em inglês) é um conceito de agricultura para o cultivo de plantas dentro de edifícios ou de vários andares de arranha-céus. São também chamadas de farmscrapers, termo derivado do inglês skyscraper. Nestes edifícios, que funcionariam como estufas de grande dimensão, a agricultura envolve o uso de tecnologias como a hidroponia para auxiliar no crescimento das plantas. Alguns projetos incluem a prática de pecuária (especialmente aves) nos pisos inferiores.

Visão futurista de uma fazenda vertical (Ilustração)

O conceito foi desenvolvido em 1999 pelo biólogo Dickson Despommier da Universidade Colúmbia em Nova York, embora essa ideia tenha predecessores como a visão do físico Cesare Marchetti, que em 1979, concebeu um conceito similar. Atualmente várias cidades estudam a construção de farmscrapers e existe um grande número delas, a maioria funcionando ainda em caráter experimental, com vistas ao desenvolvimento dessa tecnologia. Essas cidades estão sobretudo nos Estados Unidos, Canadá, Holanda, Coreia do Sul, Japão, China e Emirados Árabes Unidos.

A vantagem da introdução em larga escala dessa tecnologia seria multiplicar a superfície cultivável praticamente sem custo, o que possibilitaria devolver vastas áreas de terra ao seu estado natural. Além disso, os defensores do conceito argumentam que a técnica reduziria significativamente os custos de transporte e logística pelo fato de as fazendas verticais estarem localizadas na vizinhança imediata dos consumidores.

Segundo Despommier, uma única fazenda de 30 andares na vertical poderia alimentar mais de 10 mil pessoas.

Vídeo: Palestra de Stuart Oda no TED

 

Tradução integral da palestra de Stuart Oda:

Se você mora no planeta Terra e é um dos sete bilhões de pessoas que come todos os dias, preciso que você preste atenção, porque, nas próximas três décadas, precisaremos abordar um dos desafios globais mais críticos de nossa geração.

E não estou falando sobre mudança climática. Estou falando sobre comida e agricultura. Em 2050, nossa população global está projetada para atingir 9,8 bilhões, com 68% de nós vivendo em centros urbanos. Para alimentar essa população massiva, precisaremos aumentar nossa produção agrícola em 70% acima dos níveis atuais. Colocando esse número em perspectiva, precisaremos cultivar mais comida nos próximos 35 a 40 anos do que nos 10 mil anos anteriores combinados. Simplificando, não só nossa população global está se tornando maior, mas também está ficando mais densa, e precisaremos cultivar significativamente mais comida usando significativamente menos terra e recursos.

Complicar nossos esforços atuais para lidar com essas grandes mudanças demográficas são os desafios enfrentados pela indústria agrícola hoje. No mundo inteiro, um terço da comida que produzimos é desperdiçada, chegando a 1,6 bilhão de tonelada de alimentos que estraga no caminho para o mercado, expira em nossos refrigeradores ou é simplesmente jogada fora por supermercados e restaurantes ao fim do dia. Todo ano, até 600 milhões de pessoas vão ficar doentes por comer alimentos contaminados, destacando o desafio que temos de manter a segurança alimentar global. E, talvez sem surpresa, a indústria agrícola é a maior consumidora de água potável, representando 70% do uso global.

Uma grande fazenda vertical interna, para cultivo hidropônico

Agora, você ficará aliviado em saber que a indústria agrícola e que o movimento global de universidades, empresas e ONGs estão realizando uma pesquisa abrangente e desenvolvendo novas tecnologias para resolver todos esses problemas. E muitos o fazem há décadas. Mas uma das mais recentes inovações na produção de alimentos implantada em parques industriais na América do Norte, nos centros urbanos da Ásia, e mesmo nos desertos áridos do Oriente Médio, é a agricultura em ambiente controlado.

Esse tipo de agricultura é apenas uma maneira chique de dizer agricultura à prova de intempéries ou clima. Muitas dessas fazendas cultivam alimentos tridimensionalmente em prateleiras verticais, ao contrário das duas dimensões de fazendas convencionais. Dessa forma, esse tipo de produção de alimentos também é referido como agricultura vertical interna.

Tenho trabalhado com cultivo vertical interno nos últimos cinco anos e meio, desenvolvendo tecnologia pra fazer esse tipo de produção de alimentos mais eficiente e acessível. Esta foto foi tirada no lado de fora de um contêiner de transporte desativado que convertemos em uma fazenda coberta e depois lançamos no coração e no calor de Dubai.

A agricultura vertical interna é um fenômeno relativamente recente, comercialmente falando, e a razão é que os consumidores se preocupam mais com a segurança alimentar e de onde vem a comida, e também com a tecnologia necessária para tornar isso possível que esteja mais prontamente disponível e a menor custo. E o custo total da produção de alimentos globalmente está realmente aumentando, fazendo esse tipo de produção de alimentos mais competitivo.

Então, se você quer construir uma fazenda vertical coberta, é preciso substituir alguns dos elementos convencionais da agricultura com substitutos artificiais, começando com a luz do sol. Em fazendas verticais internas, a luz solar natural é substituída com iluminação artificial como LEDs. Embora existam muitos tipos diferentes de LEDs sendo usados, aquele que decidimos instalar aqui é chamado de “LEDs de espectro total” que foi otimizado para o tipo de vegetais que estávamos cultivando. Além disso, para maximizar produção para um determinado espaço, fazendas verticais internas também utilizam e instalam sistemas de estantes para cultivar legumes verticalmente, e algumas das maiores instalações empilham sua produção em 14 a 16 andares de altura.

Agora, a maioria dessas fazendas usa de sistemas hidropônicos ou aeropônicos, o que significa que em vez de usar o solo eles usam um material substituto como esponjas de poliuretano, turfa biodegradável e até materiais inorgânicos como pelotas de perlite e argila. Outro aspecto único sobre essas fazendas é que elas usam uma fórmula nutritiva precisa que é circulada e reciclada em toda a instalação, e essa é bombeada diretamente à zona das raízes dos vegetais para promover o crescimento das plantas. E, por último, essas fazendas usam um sistema de monitoramento e de automação sofisticado para aumentar significativamente a produtividade, a eficiência e a consistência, e essas ferramentas também fornecem o benefício adicionado de produzir alimentos que são mais rastreáveis e seguros.

O empresário futurista Stuart Oda

Alguns dos benefícios óbvios de cultivar alimentos dessa maneira é que você tem produção vegetal o ano todo, qualidade consistente e resultados previsíveis. Alguns dos outros grandes benefícios incluem o uso de recursos de forma significantemente mais eficiente, particularmente da água. Para cada quilograma de vegetais cultivados dessa maneira, centenas de litros de água são conservados em comparação com os métodos agrícolas convencionais. E com a economia de água vêm economias semelhantes no uso de fertilizantes. Uma das fazendas de maior rendimento cresce mais de 350 vezes mais comida por metro quadrado do que uma fazenda convencional. E ser à prova do clima significa controle completo de contaminantes recebidos e de pragas, eliminando completamente a necessidade do uso de pesticidas químicos. E para sermos claros, essas fazendas podem produzir enormes quantidades de comida, com uma das maiores instalações produzindo 30 mil peças de vegetais por dia.

No entanto, como em qualquer nova tecnologia ou inovação, existem algumas desvantagens. Como podem imaginar, cultivo de alimentos desta maneira pode gastar muito mais energia. Além disso, essas fazendas só podem produzir uma pequena variedade de vegetais comercialmente e o custo total da produção ainda é bastante alto.

E, para abordar essas questões, algumas das maiores e mais sofisticadas fazendas estão fazendo investimentos significativos, começando com eficiência energética. Para reduzir o alto consumo de energia, existem esforços para desenvolver LEDs de maior eficiência, para desenvolver lasers, otimizados para o crescimento das plantas e até mesmo para usar cabos de fibra óptica como esses para canalizar a luz solar diretamente para uma fazenda vertical coberta durante o dia a fim de reduzir a necessidade de iluminação artificial.

Ademais, para reduzir os custos associados à contratação de uma mão de obra mais sofisticada, mais urbana e também mais qualificada, a robótica de automação é amplamente utilizada em instalações de grande escala. E eficiência nunca é demais quando se trata de recursos. Construir fazendas verticais internas dentro e em torno dos centros urbanos da cidade pode ajudar a encurtar a cadeia de distribuição de suprimentos agrícolas e também ajudar a manter o conteúdo nutricional em vegetais. Além disso, existem desertos alimentares em muitos países que têm pouco ou nenhum acesso a vegetais nutritivos, e à medida que esse setor amadurece, será possível fornecer acesso mais equitativo, de alta qualidade, a vegetais altamente nutritivos, mesmo nas comunidades mais carentes.

Finalmente, e isso é realmente emocionante para mim pessoalmente, a agricultura vertical em ambientes internos pode realmente ser integrada sem problemas na paisagem urbana para ajudar a redirecionar estruturas urbanas inutilizadas e subtilizadas. Na verdade, isso já está acontecendo hoje. Os serviços de compartilhamento de carros tiraram centenas de milhares de veículos das ruas, e eles reduziram significativamente a necessidade de estacionamento.

Essa é uma fazenda que instalamos no centro de Pequim em uma estrutura de estacionamento subterrâneo subutilizada para cultivar vegetais para os hotéis próximos. Infraestrutura subutilizada não é simplesmente limitada a projetos de engenharia civil em larga escala, ela também pode incluir espaços menores como cantos inutilizados de restaurantes. Isso é um exemplo de uma fazenda que instalamos diretamente na partição de uma entrada de um hotel para cultivar ervas frescas e microverdes no local para os chefs. Honestamente, se olhar em volta, encontrará espaço subutilizado em toda parte, debaixo, ao redor e dentro de empreendimentos urbanos. Essa é uma fazenda que instalamos em um canto vazio do escritório para cultivar legumes frescos para os funcionários em cafés próximos.

Faço parte de todos esses projetos legais, e trabalhar na indústria agrícola para melhorar o acesso a produtos frescos e nutritivos de todos e em qualquer lugar, em breve, espero, tem sido a maior alegria e também a coisa mais humilde e

E agora que te convenci que a agricultura pode ser bem sexy, você ficará surpreso e chocado ao saber que ainda tenho problemas em articular como e por que decidi trabalhar, e contínuo na indústria agrícola. Mas, alguns anos atrás, encontrei uma resposta bastante única escondendo-se em plena vista. Bem, li um artigo sobre como seu nome, particularmente seu sobrenome, pode ter uma forte influência em tudo na sua vida, desde sua personalidade a sua carreira profissional. Este é o meu sobrenome japonês: Oda. E os caracteres se traduzem literalmente como “fazendinha”.

(*) O empresário e fazendeiro urbano Stuart Oda é apaixonado por inovações na agropecuária e pela sustentabilidade. Seu objetivo é democratizar o acesso a alimentos frescos e nutritivos através da democratização dos meios e das tecnologias de produção.