Meu amigo, o jornalista e escritor Fábio Tucci Farah criou este belo relato, perfeito para ser mensagem de Natal. Faço minhas as palavras dele e tomo a liberdade de reproduzir seu texto aqui no blog. Como o Fábio, desejo a todos ótimas festas e um 2012 repleto de coisas boas
Por Fábio Tucci Farah
Pouco após o meu aniversário, fiz uma viagem à Terra Santa. Queria ver de perto os lugares por onde Cristo passou. Desejava tocar o solo sagrado com minhas mãos. Pouco menos de dois meses do Natal, me aproximei de Belém, a cidade em que o homem mais festejado deste mês nasceu. Um muro de concreto dividia Israel e Palestina. Um muro separava judeus e muçulmanos. Dentro daquela cidade, prisão a céu aberto, crianças palestinas pobres driblavam a aspereza da vida com a mesma habilidade em que jogavam bola. E, alheias à miséria, sorriam.
Ao chegar à Basílica da Natividade, construída sobre a gruta em que o Filho de Deus nasceu, pessoas de vários partes do mundo se acotovelavam para se aproximar de um dos lugares mais sagrados do cristianismo. A poucos metros dali, um guia turístico russo, com óculos escuros, boné e celular, bloqueava a passagem de um grupo para que o seu entrasse primeiro no local sagrado. Empurra-empurra, briga. Um muro invisível separava católicos, ortodoxos e protestantes. Um muro invisível dividia corações. Ao me ajoelhar diante da estrela prateada que marca o lugar do nascimento de Cristo, posso jurar que ouvi uma voz me dizer uma palavra. Uma palavra que não consegui entender. No mesmo instante, fui invadido por um estranho sentimento, um vazio que não poderia ser preenchido por toneladas de terra santa nem por litros de água sagrada do Rio Jordão.
Menos de duas semanas do Natal, recebi um convite: visitar uma família de baixa renda. Um convite que não falta nesta época do ano. Afinal, é a época das caridades instantâneas, quando sentimos necessidade de fazer algo para preencher meses e meses de egoísmo. Mas, confesso, não foi uma experiência como as anteriores. E, justamente na época das caridades instantâneas e das mensagens instantâneas, resolvi compartilhá-la com vocês. Um casal, na região rural de Taubaté, adotou mais de dez crianças abandonadas. Com poucos recursos no bolso, e uma fortuna no coração, construiu uma belíssima família.
Na sala/cozinha da pequena casa, sem reboco nas paredes, um presépio dividia espaço com móveis, fogão, geladeira, cestas-básicas, brinquedos. Olhei para o menino Jesus de gesso. Ele sorria. Aquele sorriso parecia esconder um segredo. Nas horas seguintes, me espantei ao observar uma pequena criança, com o mesmo sorriso do bebê de Maria, correndo pelo quintal com um menino muito especial chamado Rafael. A mesma criança brincou de esconde-esconde com Miguel e dançou com João. Não sem surpresa, a flagrei comendo doces com Joana e chupando picolés com Carol. Ela sorria como se tudo fosse uma grande festa. E com o sorriso era capaz de derrubar todos os muros que existiam no coração de qualquer pessoa.
Hoje, às vésperas do Natal, terminei a leitura de um livro de G.K. Chesterton. Em uma das passagens, o escritor inglês diz que, talvez, o maior segredo de Deus seja a sua alegria. Fechei os olhos e me lembrei da gruta vazia em Belém. Senti um aperto no peito. No momento seguinte, fui inundado pelo sorriso das crianças palestinas jogando bola. Ele se misturava ao sorriso das crianças do interior de São Paulo. Tinham o mesmo reflexo, o reflexo do sorriso do menino Jesus de gesso no presépio daquela sala/cozinha. Sem querer, fui iluminado com a certeza de que aquelas crianças simples compartilhavam o segredo de Deus. Melhor do que ninguém, elas festejavam – e festejam – o Natal. Hoje, olho meu próprio presépio e ouço a mesma palavra que ouvi em Belém. E hoje, apenas hoje, descobri exatamente o que ela significa.
Originally posted 2011-12-23 20:03:40.