Lei do carma. Tudo que você faz, um dia volta pra você

 

É o mote central da novela “O outro lado do paraíso”: Tudo que você faz, um dia volta pra você. Dito assim, parece coisa ligada ao grande banco de sabedoria universal que nos acostumamos a chamar, às vezes com uma ponta de arrogância tola e ironia injustificada, de “crendices populares”. Sistemas filosóficos multimilenares como o da Índia, no entanto, fazem dessas crenças a própria base da sua sabedoria. É o caso da Lei do Carma, a “lei do retorno”, pela qual tudo o que fazemos, pensamos e sentimos é lançado ao mundo como uma onda de força que, depois, volta para nós. Muitas vezes acrescida e aumentada com a força de quem a recebeu…  A imagem de abertura é uma representação do deus hinduísta Shiva, considerado “O Senhor do Carma”.          

Por: Luis Pellegrini

Há muitos anos, ao redor de 1975, quando trabalhava como jovem repórter no jornal Última Hora, no Rio de Janeiro, recebi a incumbência de entrevistar o inglês John Coats, então presidente da Sociedade Teosófica Internacional. Com sede na cidade de Adyar, no sul da Índia, essa sociedade mais que centenária desempenhava importante trabalho de divulgação no mundo ocidental dos conhecimentos filosóficos e esotéricos das tradições orientais. Coats estava no Rio para uma série de conferências. Entre as perguntas que lhe fiz, uma dizia respeito à tão falada “lei do carma”. Coats não se fez de rogado e, após uma breve explanação da ideia, decidiu dar um exemplo concreto.

“Tudo aquilo que existe tem carma, está submetido à lei da ação e reação. Não apenas as pessoas, mas também as sociedades e inclusive os países. Meu país, a Inglaterra, enriqueceu e se tornou poderoso porque, durante séculos, colonizou e explorou dezenas de nações mais frágeis. Fomos lá com nossos soldados e nossas armas, nos instalamos na casa dos outros sem termos sido convidados e tiramos proveito de tudo aquilo que lá encontramos. Ao fazê-lo, criamos carma. Pois bem: passado o ciclo colonialista, o movimento da força se inverteu, como é natural e justo que aconteça. Agora são os nossos ex-colonizados que emigram em massa para a Inglaterra em busca de trabalho e de uma vida mais segura e confortável. E nós, ingleses, reclamamos que estamos sendo “invadidos”, que nosso território está sendo ocupado por “estrangeiros”… Sabe o que é isso? É a lei do retorno, a lei do carma em ação”.

Ao tecer tais considerações, John Coats estava também profetizando algo que, nas décadas seguintes, envolveria todas as demais nações colonialistas europeias. Todas elas, como acontece nos dias de hoje, “invadidas” pelos desvalidos das nações do Terceiro Mundo que foram outrora colonizadas pelos europeus. Desvalidos que na Europa buscam refúgio, abrigo e proteção.

O que é carma?

Carma é a palavra em sânscrito que significa ação. É o equivalente, na metafísica indiana, à terceira lei de Newton que diz: “A toda ação corresponde uma reação de igual intensidade, mas que atua no sentido oposto”. A força é resultado da interação entre os corpos, ou seja, um corpo produz a força e outro corpo a recebe. Durante seus estudos, Isaac Newton percebeu que a toda ação corresponde uma reação.

Em outras palavras, carma significa que quando pensamos, falamos ou agimos, desencadeamos uma força que irá gerar uma reação na forma de uma outra força que tenderá a voltar à sua própria origem. Ao longo da longa cadeia da nossa existência como seres conscientes e sencientes (que percebem as coisas pelos sentidos) na superfície do planeta, homens e mulheres tentaram modificar, cambiar ou suspender o poder da força que retorna. Talvez alguns tenham, em alguma medida, conseguido a proeza de fazê-lo, mas a verdade é que a imensa maioria das pessoas não têm condições para erradicar ou desviar os efeitos das ações físicas, emocionais, mentais e espirituais que elas mesmas desencadearam.

O que tudo isso significa em termos práticos? É simples. Significa que todos nós somos, em maior ou menor medida, escravos das nossas próprias ações, não importa em qual dimensão existencial elas sejam praticadas.

Uma pessoa, portanto, não pode escapar das consequências das suas ações. Mas, segundo a antiga sabedoria da Índia, essa pessoa só irá sofrer esses efeitos quando, por sua própria iniciativa, tiver construído as condições que a deixam aberta e vulnerável a esse retorno que muitas vezes se traduz em sofrimento.

Importante: A ignorância da lei do carma não isenta a pessoa de sofrer as consequências dos seus próprios atos. O carma é uma lei universal totalmente cega. Ele é colocado automaticamente em movimento todas as vezes que uma ação é desencadeada.

Nestes tempos turbulentos que estamos vivendo, tempos em que tantos – inclusive nas mais altas esferas da nossa sociedade – parecem ter perdido a noção de consequência e de responsabilidade – talvez seja importante refletirmos a respeito da sabedoria contida na noção de lei do carma. Sobretudo porque ela não se assenta apenas em uma visão espiritual do mundo e da nossa presença nele. A lei do carma nos fala de uma fenomenologia prática, objetiva, tão conectada às leis do espírito quanto às leis da matéria.

Para ajudar a entender essa lei, em seus múltiplos aspectos, aqui vão algumas gotas de sabedoria que os orientais chamam de “As 12 leis do carma”. De maneira clara e sintética, elas nos apresentam alguns vislumbres básicos dessa lógica universal pela qual “tudo que você faz, um dia volta pra você”.

As 12 leis do carma

1 – A grande lei (Também conhecida como “lei de causa e efeito”) – Tudo que você planta, um dia você colhe. Tudo que lançamos no universo, voltará para nós. Se o que desejamos é felicidade, paz, amor, amizade… devemos então sermos felizes, pacíficos, amorosos e amigos leais.

2 – A lei da criação –  A vida não acontece simplesmente, ela requer a nossa participação. Somos um com o universo, tanto interna quanto externamente. Tudo aquilo que nos cerca nos fornece chaves para abrir o nosso mundo interior. Seja você mesmo, sempre, e traga para perto de si tudo aquilo que você deseja que esteja presente em sua vida.

3 – A lei da humildade – Enquanto você se recusar a aceitar uma realidade, ela continuará a fazer parte de você. Se você considerar um inimigo tudo aquilo que vê, ou alguém com traços de caráter que você julga serem negativos, é porque você ainda não está focado em um nível mais elevado da existência.

4 – A lei do crescimento – Para onde você for, aí você estará. Se quiser crescer espiritualmente, é a si mesmo que você terá de mudar – e não as outras pessoas, lugares e coisas que estão ao seu redor. A única coisa que você realmente possui em sua vida é a si mesmo, e você é a única coisa sobre a qual você pode ter controle. Quando, em nossos corações, conseguimos mudar quem somos e como somos, todos os aspectos da nossa vida irão acompanhar essa mudança.

5 – A lei da responsabilidade – Sempre que alguma coisa estiver errada em sua vida, haverá alguma coisa de errado em você mesmo. Nós refletimos aquilo que nos cerca – e aquilo que nos cerca nos espelha; esta é a verdade universal. Somos responsáveis por tudo aquilo que existe e acontece em nossas vidas, e precisamos assumir essa responsabilidade se quisermos modificar o rumo das coisas.

6 – A lei da conexão – Até mesmo quando aquilo que estamos fazendo parecer inconsequente, é muito importante que ele seja feito como se tudo aquilo que existe no Universo esteja conectado. Cada passo leva ao passo sucessivo, e assim por diante. Alguém precisa dar o pontapé inicial para que a partida tenha início. Nem o primeiro passo, nem o último, possuem grande importância e significado, pois ambos precisam cumprir a verdadeira tarefa: a caminhada como um todo. Passado-presente-futuro estão todos conectados.

7 – A lei do foco – Você não pode pensar duas coisas ao mesmo tempo. Quando o seu foco está dirigido para valores espirituais, é impossível ter pensamentos de nível mais baixo, tais como os de cobiça ou de raiva.

8 – A lei da doação e da hospitalidade – Se você acredita que alguma coisa é verdadeira, em algum momento da sua vida você será chamado a demonstrar e defender essa sua verdade pessoal. Esse será o momento em que você poderá colocar em prática aquilo que você aprendeu ou percebeu em teoria.

9 – A lei do aqui e agora – A tendência a olhar para trás, a examinar aquilo que já passou, nos impede de vivermos plenamente o aqui e agora. Velhos pensamentos, velhos padrões de comportamento, velhos sonhos… tudo isso impede a vivência de experiências novas e renovadoras.

10 – A lei da mudança –  A mesma história se repete até que tenhamos aprendido  a lição de que é preciso mudar a nossa trajetória de vida.

11 – A lei da paciência e da recompensa – Toda recompensa requer um esforço inicial. Recompensas de valor duradouro exigem trabalho paciente e persistente. A verdadeira alegria é alcançada quando cumprimos a tarefa que deve ser cumprida, animados pela convicção de que a recompensa chegará no seu devido tempo.

12 – A lei da importância e da inspiração – O valor dos nossos triunfos e erros depende da intenção e da energia que desprendemos para alcançar o fim. Contribuímos individualmente para uma totalidade, e portanto nossas ações não podem ser medíocres: temos que colocar todo o nosso coração em cada coisa que fazemos. Contribuições amorosas fortalecem a vida e inspiram a consciência do Todo.

Mantra “Om namaha Shivay”, dedicado a Shiva, divindade do panteão hinduísta, também chamado de “O Senhor do Carma”.

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