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Tralha da vovó. Ninguém quer mais a herança da família

 

Nesta era de minimalismo e mobilidade, quem vai ficar com as porcelanas chinesas? Num artigo divertido e inteligente, o arquiteto norte-americano Lloyd Alter comenta a mudança de mentalidade e de hábitos de vida que agora faz as pessoas desejarem possuir o menos possível – sobretudo quando se trata de móveis e utensílios antigos, agora considerados simples velharias. Ria e se prepare: mais cedo ou mais tarde você também irá passar por isso.

Por: Lloyd Alter

Fonte: Site www

Como arquiteto, ser minimalista é parte do meu treinamento. Foram necessários 30 anos de carreira para que eu começasse a achar aceitável a presença de cadeiras na sala de jantar. Eu não gosto de desordem. No entanto, para atrapalhar a ordem e o estilo da minha sala jantar existe agora uma estante de madeira velha e escura cheia de xícaras de chá e pratos de louça que pertenciam à minha falecida sogra, itens dos quais minha esposa não está minimamente disposta a abrir mão.

Por sorte, minha filha estava começando a montar sua própria casa quando sua avó morreu, e assim, pelo menos, o conjunto de móveis da sua sala de jantar e o aparador encontraram uma casa que não é a minha. Mas, para muitas pessoas, não é tão fácil. A maioria dos membros da geração “baby boomers”, que veio depois da minha, já está estabelecida e abarrotada e não precisam de ainda mais objetos herdados dos pais e dos avós. Os filhos deles, então, vivem em cubículos e, ou não gostam de objetos antigos, ou não dispõem de espaço suficiente em suas moradas para tê-los.

Escrevendo na revista Next Avenue, o comentarista Richard Eisenberg observa que ninguém quer mais aquelas coisas antigas grandonas. “As mesas e cadeiras da sala de jantar, os aparadores e mesas auxiliares, bem como os armários (“peças marrons”) tornaram-se persona non grata. Antiguidades não mais são vistas como tal, e sim como velharias antiquadas.

Um especialista em se livrar de tralha inútil explica: “Esta é a geração da Ikea, da Tok Stock e das Casas Bahia. São pessoas que vivem com o mínimo, ainda mais do que os da geração anterior. Eles não têm a conexão emocional com as coisas que as gerações anteriores tinham. E eles são muito mais móveis. Assim sendo, não querem arrastar um monte de coisas pesadas quando se põem em movimento pelo país a fora em busca de novas oportunidades”. Ou, mais provavelmente, não têm mais os tipos de carreiras profissionais que lhes permitem viver em casas com espaço para dar e vender.

Como, então, nos livramos de coisas herdadas que não desejamos conservar?

Livrar-se de coisas é difícil, e leva tempo. De acordo com Eisenberg, é melhor começar cedo, enquanto os pais ainda estão por aí. Tente aprender a história, as histórias das coisas e dos objetos que fazem parte da vida deles. Você nunca sabe, alguns desses itens podem ter valor real. Alternativamente, a geração mais velha pode simplesmente começar a dar tudo. Tive uma tia idosa que, toda vez que eu visitava, insistia em me dar algo para levar para casa. Uma vez me deu uma lata que era um acendedor de churrasqueira e que estava sem uso desde os anos 70. Minha tia encontrara uma ótima maneira de limpar a tralha da sua garagem…

Eisenberg, que é um especialista, tem muitas outras dicas, mas a sua dica final é a mais importante e realista. Ele diz que o melhor conselho é preparar-se para uma decepção. “Pela primeira vez na história do mundo, duas gerações estão reduzindo o tamanho simultaneamente”, ele diz. “Eu tenho uma parente de 90 anos que quer me dar coisas. Para nos obrigar a aceitar, ela nos ameaça dizendo que, quando ela falecer, eu e meus irmão teremos de esvaziar e limpar a casa, e isso será muito pior. Mas eu e meus irmãos temos entre 60 e 70 anos, e estamos doidos para reduzir o tamanho de nossas existências. E a velha parente insistindo: Peguem alguns livros, por favor!”

Nem o depósito bastou

Tudo isso é absolutamente verdadeiro. Minha sogra mudou de casa ao mesmo tempo em que eu e minha mulher estávamos reformando e reduzindo tudo em nossa própria casa. Sem saber o que fazer, chegamos a alugar um depósito, mas ele ficou cheio e ainda tínhamos um monte de coisas sobrando. Agora que vivemos em um espaço muito menor, não há muito espaço para qualquer coisa que eu poderia querer quando minha mãe de 98 anos de idade – sim, as pessoas não morrem mais! – sair do seu apartamento que mais parece um museu de quinquilharias antigas.

Enquanto isso, o lustre de cristal da minha sogra agora ilumina as escadas do meu sobradinho… (Foto: Lloyd Alter)

Não só os gostos mudaram, mas a forma como as pessoas pensam sobre as coisas também mudo. Nossas necessidades mudaram. Poucas pessoas têm sala de jantar formal ou um lugar para lustres de cristal. Com a cultura descartável de hoje, é mais barato comprar um sofá da Ikea do que contratar um caminhão e um motorista para o sofá gigante forrado de veludo da avó. Grande parte dos móveis mais antigos não cabem nos condomínios pequenos de hoje. Alguns deles nem sequer cabem no elevador. E a negociante de móveis usados Carol Eppel conclui: “Eu não acho que exista um futuro para as posses da geração de nossos pais. Vivemos em um mundo diferente”.

Então, aprenda o que puder sobre as posses de seus pais ou avós e descubra se elas possuem algum valor, emocional ou financeiro. Mas, se você não tiver espaço, você já conhece a resposta para essa dúvida. Desapegue, passe nos cobres tudo que tiver valor, e chame a Casa André Luiz ou similares para vir com o seu caminhão e levar tudo embora. Garanto que é melhor ter essa conversa difícil com o cônjuge mais cedo, e não mais tarde.

Semana que vem escrevo um outro artigo explicando com mais detalhes o que fazer para se livrar das coisas. Aguardem.