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Baleias. Inteligentes, gostam de música, imitam a voz humana

Enredada por um cabo submarino de rede internet/telefônica, uma baleia jubarte esperou calmamente que uma equipe humana de socorro conseguisse libertá-la. Um fotógrafo norueguês documentou a história, que constitui mais uma prova da extraordinária sensibilidade e inteligência desses animais. Na foto de abertura, acima, o olhar aterrorizado da jubarte e o cabo de rede (na cor amarela). Ao fundo, o barco da guarda costeira norueguesa. O autor dessa imagem excepcional é o fotógrafo norueguês Audun Rikardsen.

Por: Luis Pellegrini

Deram a ela o nome de Hacker, uma baleia jubarte (Megaptera novaeangliae) que estava inspecionando o fiorde de Kaldfjorden, uma área muito visitada por baleias não muito distante de Tromso (Noruega), e que acabou enredada em um cabo submarino de rede internet/telefônica. A jubarte, também conhecida como baleia-corcunda ou baleia-cantora, é um mamífero marinho que ocorre na maioria dos oceanos. Ela é da ordem dos cetartiodactylos, subordem dos cetáceos e infraordem dos misticetos.

Por sorte, nas imediações estava navegando Audun Rikardsen, um fotógrafo naturalista, à caça de situações que merecessem ser fotografadas. O encontro dele com a baleia foi narrado no número de novembro da revista New Scientist. Ao perceber que havia algo de errado com o enorme animal, Rikardsen foi chamar a guarda costeira e retornou ao local com um amigo para tentar salvar Hacker.

A baleia, inicialmente aterrorizada, parece ter percebido, em certo momento, que eles estavam lá para ajuda-la, e deixou que os dois se aproximassem. “Ela chegou bem perto do nosso pequeno barco, com todas as suas trinta toneladas. Se quisesse, poderia facilmente ter virado nossa embarcação, mas não fez isso. Estava claramente nos pedindo ajuda”, comentou o fotógrafo. Mas mesmo após 4 ou 5 horas de esforços, os dois homens não conseguiraam soltá-la. Finalmente chegou a guarda costeira (na foto) que tentou liberar a baleia durante toda a noite, até que, ao amanhecer, mandaram um mergulhador às profundezas para resolver o problema.

Só então todos perceberam que o cetáceo não ficara preso nas cordas de uma rede de pesca, mas por um cabo internet/telefônico que deveria estar a 170 metros de profundidade, pousado no fundo do fiorde, e que prendia o animal de um lado para o outro na boca, envolvendo-o também ao redor de uma nadadeira e da cauda. Depois de um dia e uma noite de esforços, Hacker finalmente foi libertada e partiu para o alto mar. Skulsfjord, a cidadezinha do fotógrafo, ficou sem telefone nem conexão pela rede durante duas semanas, até que o cabo foi substituído.

O notável, em toda essa história, foi o comportamento calmo e inteligente do animal. Ele pareceu ter percebido claramente a intenção de ajuda dos homens, e manteve-se o tempo todo calmo e sem agitação.

Um grau de compreensão excepcional

Em todo o mundo, é enorme o repertório de histórias que dão testemunho da inteligência e capacidade perceptiva das baleias e dos golfinhos. Eu mesmo, no porto pesqueiro de Luiz Correia, no Piauí, ouvi de pescadores o relato incrível de um boto cinza que, durante horas, conduziu um barco até o local onde estava um marinheiro que, após umas cachaças a mais, caíra o mar durante a madrugada e nenhum dos seus colegas percebeu, pois estavam todos dormindo. “Ao amanhecer, quando percebemos que nosso colega não estava no barco, ficamos desesperados. Tínhamos viajado no mar alto a noite toda, como poderíamos encontrá-lo? Foi então que um boto cinza se aproximou da proa do nosso barco, parecendo agitado, e começou a saltar à esquerda, como se quisesse nos mostrar a direção. Ele continuou assim, saltando à direita ou à esquerda, sempre que queria nos mostrar o rumo justo. Após algumas horas, encontramos nosso amigo boiando nas água. Nós o recolhemos e ele foi levado de volta são e salvo graças àquele animal. Foi ele que nos conduziu diretamente ao nosso colega”, narrou um dos pescadores.

Há muitas coisas que conhecemos pouco a respeito dos cetáceos e dos delfinídeos. Muitos desses animais dormem “em pé”, outros conseguem imitar a voz humana, inclusive nossas canções e alguns vivem até 200 anos. Aqui está uma galeria de imagens e informações curiosas sobre baleias, belugas, cachalotes, gigantes misteriosos e que apresentam alguns traços “humanos”.

 

1 Baleia azul, o maior animal do mundo. Com suas 180 toneladas de peso, bem distribuídas sobre os seus trinta metros de comprimento, a baleia azul (Balaenoptera musculus) é, em termos de massa corporal, o maior mamífero vivo. Ela é inclusive maior que a imensa maioria dos dinossauros, se se exclui o gigantesco Amphicoelias, um tipo de dinossauro saurópodo extinto. Seu coração tem o tamanho de um carro pequeno, e bate tão forte que poderia ser ouvido a 3 quilômetros de distância. Até pouco tempo atrás, acreditava-se que suas artérias fossem largas o suficiente para permitir que um homem passasse por elas a nado. Mas a recente autopsia de uma baleia azul que encalhou numa praia desmentiu essa convicção.

 

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2 As belugas gostam de música. Comumente chamadas de “canários do mar” por causa das vocalizações agudas e muito musicais que emitem para se comunicar, as belugas (Delphinapterus leucas), grandes cetáceos brancos difusos nos mares frios, mostram, no cativeiro, uma certa predileção pela música e pela interação com os humanos. Em muitas ocasiões, podendo escolher entre entocar-se num canto escuro ou aproximar-se de um músico quando ele tocava um trecho musical, as belugas escolheram esta última opção. Alguns exemplares inclusive conseguem acompanhar o ritmo da música com movimentos do seu corpo, o que demonstra que elas conseguem ouvir as notas.

 

3 Podem engolir tanta água quanto o seu próprio peso. Os cetáceos, particularmente as baleias de barbatana, podem ingerir de uma só vez até 480 mil quilocalorias contidas no krill, o pequeno crustáceo que elas adoram. A água em excesso que vem junto com a comida é expulsa através das barbatanas, que são lâminas presentes nas bocas de algumas baleias e que atuam como filtros.

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4 As jubartes cultivam suas “melhores amigas”. As fêmeas jubarte formam laços de amizade que se tornam tão sólidos a ponto de resistirem às distâncias oceânicas. Quando duas amigas se encontram, mesmo após anos de distância, elas demonstram alegria e se reconhecem como seres de uma mesma família. Isso foi descoberto, após 16 anos de observações, por cientistas canadenses do grupo Mingan Island Cetacean Study. As amigas – quase todas fêmeas e geralmente da mesma idade – se reencontram todos os anos depois da temporada de acasalamentos e das migrações, reconhecendo-se mesmo entre vários exemplares. A instauração de laços de amizade facilita a caça (que é feita “em cooperativa”, e as fêmeas que têm amigas costumam ter filhotes mais sadios. Antes dessa descoberta, pensava-se que esses animais fossem pouco sociáveis.

 

5 Os cachalotes dormem “em pé”. Até há pouco acreditava-se que o cachalote (Physeter macrocephalus) assim como o golfinho, deixassem em repouso um hemisfério cerebral por vez, permanecendo em vigília com metade do corpo em caso de perigo. Mas em 2013 uma equipe de pesquisadores da Universidade de St Andrew (GB) topou acidentalmente com um bando de cachalotes imobilizados em posição vertical, com a cabeça que às vezes chegava até a superfície. Estavam dormindo: o pequeno barco dos cientistas apagou os motores e passou silenciosamente por entre os animais, sem provocar reações. Acidentalmente, no final do trajeto, o barco se chocou contra um dos cachalotes: o bando inteiro acordou e imediatamente se dirigiu para as profundezas do oceano. Essas sonecas duram geralmente entre 12 e 20 minutos e acontecem, não se sabe por que, sobretudo entre as 18 horas e a meia noite.

 

Bowhead Whale (Balaena mysticetus) breaching. Foxe Basin, Nunavut, Canada, April.

6 A baleia ártica pode viver até 200 anos. Não obstante a maior parte dos exemplares viva entre 60 e 90 anos, a presença de antigos fragmentos de arpões encontrados nas carnes de algumas baleias da Groenlândia (Balaena mysticetus) que escaparam ao ataque das baleeiras fazem pensar que alguns exemplares podem superar amplamente os 100 anos de vida, chegando aos 200 anos. A análise do tecido ocular de alguns exemplares mortos parece confirmar essa longevidade. Alguns cientistas, por seu lado, lançaram a hipótese de que esses cetáceos também passam por um processo análogo ao da menopausa humana, dada a importante e consistente presença de exemplares fêmeas muito grandes e sem filhotes ao lado.

 

7 Algumas conseguem imitar a voz humana. O caso mais emblemático é o de Noc, a beluga da National Marine Mammal Foundation de San Diego, Califórnia, que se tornou famosa por conseguir reproduzir nas suas vocalizações os padrões sonoros típicos de conversações entre humanos (ouça no vídeo). As suas imitações eram tão fieis (era capaz inclusive de imitar o sotaque regional da fala de alguns dos seus tratadores) que um dos adestradores, ao ouvi-la, um dia saiu da água convencido de que algum colega estivesse falando com ele à distância. Alguns estudos demonstraram que Noc, como outros belugas imitadores antes dele já tinham feito, produziam aqueles sons enchendo de ar cavidades aéreas com uma pressão não usual, muito superior às pressões usadas para produzir as vocalizações normais de belugas.

Video: NOC imitando a fala humana

 

8 As canções das jubartes são como musica pop. Essas “canções” se difundem no seio da sociedade dessas baleias com dinâmicas similares às das “músicas da moda” que são difundidas pelas rádios. Ou seja, outras baleias as ouvem, mesmo à distância, e passam a reproduzi-las. Estudiosos da Universidade de Queensland, na Austrália, demonstraram que, no interno de uma mesma população de jubartes, os machos tendem – no mesmo período – a produzir os mesmos conjuntos de sons (uma melodia que pode ser comparada a uma canção) de acasalamento. Com o tempo, o motivo vai mudando, tornando-se cada vez mais preciso e audível: quanto mais ele faz sucesso, mais é fácil que se difunda em outras populações de jubartes, começando pelas populações mais próximas, e muitas vezes produzindo um mix com canções pregressas, criadas na temporada anterior.

 

MOBY DICK, Gregory Peck, 1956

9 Moby Dick existiu realmente. Ou, melhor dizendo, o romance publicado em 1851 por Herman Melville parece ter-se inspirado em relatos de fatos realmente ocorridos com a desafortunada tripulação de uma baleeira, de nome Essex. Em 1820, um dos seus barcos com arpoadores  foi arrastado para longe da baleeira por um cachalote que assumiu postura defensiva. O animal acabou virando o barco, lançando ao mar todos os seus tripulantes, em pleno Pacífico sul. Os sobreviventes, depois, conseguiram desvirar o barco e subir nele. Mas permaneceram à deriva por 90 dias e, para sobreviver, acabaram se entregando ao canibalismo.

 

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10 Adotam outros animais (ou objetos). Em 2011, um grupo de cachalotes foi observado cuidando, em diversas ocasiões, de um golfinho nariz-de-garrafa que tinham uma má formação espinhal (na foto), o que determinara o seu afastamento do grupo de golfinhos. Algumas vezes, belugas em liberdade foram observadas tratando pedaços de madeira ou carcaças de caribús como se fossem bonecas, substitutas de seus próprios filhotes.