“Sonho com um mundo onde as aulas de geografia ensinem sobre a crise climática como um grande desafio que foi vencido por pessoas como você e eu”, diz a ativista climática Luisa Neubauer. Com Greta Thunberg, Neubauer ajudou a iniciar “sextas-feiras para o futuro”, o importante movimento internacional de greve escolar que protesta contra a falta de ação sobre a crise climática. Ela compartilha os quatro primeiros passos que qualquer pessoa, independentemente da idade, pode adotar para se tornar um ativista climático. “Este não é um trabalho para uma única geração. Este é um trabalho para a humanidade”, diz ela.
Vídeo: TED Ideas Worth Spreading
Tradução: Cristiano Frota. Revisão: Maricene Crus
Luisa Neubauer é uma ativista climática, escritora e líder do movimento “Fridays for Future”, que atua sobretudo nos meios estudantis em muitos países preconizando uma postura mais série e proativa dos governos em favor da preservação do meio ambiente em escala planetária. O movimento foi inspirado na garota sueca Greta Thunberg. Preocupada do aumento global da temperatura, Neubauer organiza ações de massa destinadas a pressionar os governos a tomarem providências e a cumprir as decisões acordadas no Acordo de Paris 2015.
Vídeo: Palestra de Luisa Neubauer no TED
Tradução integral da palestra de Luisa Neubauer:
Nunca planejei me tornar ativista climática. Mas as coisas mudaram, e agora, aqui na frente, como ativista climática, peço que se tornem um também. Aqui está o porquê, e o mais importante, como.
Dez anos atrás, quando eu tinha 13 anos, aprendi sobre o efeito estufa. Naquela época, passamos 90 minutos falando sobre o assunto, e me lembro de achar bastante irritante, que algo tão fundamental seria espremido em uma única lição de geografia. Parte dessa irritação permaneceu, então quando me formei no ensino médio, decidi estudar geografia. só pra ter certeza que estava no caminho certo com toda essa mudança climática.
E foi aí que tudo mudou. Foi a primeira vez que observei os dados na ciência por trás da crise climática, e não pude acreditar no que estava lendo. Assim como muitos de vocês, pensei que o planeta não estava realmente em bom estado. Não tinha ideia de que estamos acelerando neste desastre em um ritmo tão rápido. Foi também a primeira vez que entendi a diferença que isso faz ao considerarmos um panorama geral. Consideremos a concentração de CO2 na atmosfera, por exemplo, o contribuinte número um para o aquecimento global. Sim, isso parece péssimo, como se estivéssemos em uma pista muito ruim. Mas é só quando não consideramos apenas os últimos 60 anos, mas sim os últimos 10 mil anos, que entendemos o quanto isso é realmente assustador. E este é apenas um aspecto da crise que estamos vendo. Eu não vou entrar em detalhes aqui, mas deixem-me dizer uma coisa: estamos em um ponto da história que a força mais destrutiva no planeta é a própria humanidade. Estamos em um ponto da história em que nenhum cientista poderá garantir que iremos sobreviver a isso. Estamos em um ponto da história que a humanidade está criando um ambiente que não é mais seguro para os seres humanos.
Sim, lá estava eu, primeiro ano de geografia, e me senti muito desesperada. Mas… havia boas notícias. No mesmo ano que aprendi sobre tudo isso, líderes de todo o mundo se reuniram em Paris pra decidir a meta comum para limitar o aquecimento global abaixo de 2° C. As imagens correram ao redor do mundo, e me disseram que aquele dia foi um momento histórico. Que alívio, certo?
Exceto… algo não deu muito certo a respeito disso. Após a assinatura desse acordo, as coisas não melhoraram. Na verdade, elas pioraram muito. Tomadores de decisão e empresários, líderes e políticos voltaram aos negócios como sempre, explorando nossos meios de subsistência como se não houvesse amanhã, literalmente, construindo novas usinas de carvão, mesmo sabendo que isso precisa parar, de acordo com o Acordo de Paris.
Então, enquanto há também bons desenvolvimentos, é claro, existem instalações de energia eólica e energia solar em todo o mundo, essas mudanças positivas são muito lentas, na verdade. Desde a assinatura do Acordo de Paris, os gráficos climáticos continuam subindo ao topo, quebrando recordes todos os anos. Os cinco anos mais quentes já registrados foram os cinco últimos anos, e em nenhum momento emissões globais têm sido superiores às emissões de hoje.
Então, ali estava eu, vendo e compreendendo a ciência de um lado, mas não via as respostas, nem a ação do outro lado. Nesse ponto, foi demais para mim. Queria ir à Conferência do Clima da ONU, naquele mesmo lugar que foi criado para unir as pessoas para corrigir o clima, só que de mentira, aparentemente. Isso foi no ano passado. Fui à Conferência do Clima e queria descobrir como é isso e do que se trata. Para políticos realistas, isso pode não ser surpresa, mas achei difícil suportar que as indústrias de combustíveis fósseis e líderes políticos estão fazendo tudo para impedir que mudanças reais aconteçam. Eles não desejam estabelecer metas ambiciosas o suficiente que nos coloquem num caminho abaixo de 2 graus centígrados. Afinal, esses são os únicos que se beneficiam dessa crise climática, certo? A indústria de combustíveis fósseis gera lucros, e líderes políticos estão de olho na próxima eleição, no que os torna populares, e acho que não estão fazendo as perguntas inconvenientes. Eles não têm intenção de mudar o jogo. Não existe país no mundo onde empresas ou poderes políticos são sancionados por destruir o clima.
Com todo o estranhamento e a tristeza por esta conferência, havia alguém que era diferente, uma pessoa que parecia bem preocupada, e era a Greta Thunberg. Eu decidi ali mesmo que todo o resto parecia sem esperança e não parecia fazer sentido, então, me juntei à greve climática dela na conferência. Foi a minha primeira greve climática e um cenário incrivelmente estranho, só eu e ela sentadas lá na sala de conferência, cercadas por uma agitada multidão de homens usando terno na conferência que não tinham ideia do que fazer conosco. E, no entanto, isso parecia mais poderoso que qualquer coisa que eu esperava há muito tempo. E foi ali que senti que talvez fosse a hora de iniciar a greve na Alemanha. Agora eu sabia que ninguém iria corrigir isso para nós, e se houvesse a menor chance de que isso poderia fazer a diferença, parecia quase tolice não tentar. Então eu…
Então, eu voltei para Berlim. Encontrei aliados que tinham a mesma ideia ao mesmo tempo, e juntos pensamos em dar uma chance a essa “sexta-feira para o futuro”. Obviamente, não tínhamos ideia no que estávamos entrando. Antes de nossa primeira greve, muitos de nós, inclusive eu, nunca tinham organizado uma manifestação pública ou qualquer tipo de protesto. Não tínhamos dinheiro, nem recursos e absolutamente nenhuma ideia do que realmente é a greve climática. Então começamos a fazer aquilo em que éramos bons: começamos a enviar mensagens de texto, noite e dia, a todos aqueles que pudéssemos alcançar, organizando nossa primeira greve climática via WhatsApp.
Na véspera da nossa primeira greve estava tão nervosa que não consegui dormir. Eu não sabia o que esperar, mas esperava o pior. Talvez fosse porque não éramos os únicos que desejavam ter uma voz em um ambiente político no qual, aparentemente, haviam esquecido de incluir a perspectiva dos jovens na tomada de decisões, talvez. Mas de alguma forma isso funcionou. E de um dia para o outro, estávamos por todo canto. E eu, de um dia para o outro, me tornei ativista climática.
Geralmente, nesses tipos de palestras TED, eu diria agora como é muito esperançoso, como nós, jovens, vamos resolver isso, como vamos salvar o futuro e o planeta e tudo mais, como nós, jovens, lutando pelo clima, vamos corrigir isso. Geralmente. Mas não é assim que isso funciona. Não é assim que esta crise funciona. Aqui está uma reviravolta: hoje, três anos e meio depois da assinatura do Acordo de Paris, quando observamos a ciência, descobrimos que ainda é possível manter o aquecimento global abaixo de 2° C… tecnicamente. E também vemos que ainda é possível evitar que outros avanços desastrosos tais como a extinção em massa e degradação do solo aconteçam, sim, tecnicamente. É simplesmente incrivelmente improvável.
E em qualquer caso, o mundo teria que ver mudanças que nunca experimentamos antes. Teríamos que descarbonizar completamente nossas economias até 2050 e transformar a distribuição de poderes, que hoje permite aos gigantes dos combustíveis fósseis e líderes políticos que fiquem no topo do jogo. Estamos falando nada menos do que a maior transformação desde a Revolução Industrial. Estamos falando, pode-se dizer, de uma revolução climática. em um período mínimo de tempo. Não temos um único ano a mais a perder.
E, de qualquer modo, para que qualquer uma dessas mudanças aconteça, o mundo precisa parar de depender de 1 a 3 milhões de estudantes grevistas para resolver isso. Sim, nós somos ótimos, vamos continuar. Vamos continuar indo a lugares que ninguém jamais nos esperaria. Mas nós não somos o limite; somos o começo. Esse não é trabalho pra uma única geração, e sim para a humanidade. E é aí que todos os olhos recaem sobre você. Para essa mudança acontecer, teremos que resolver um milhão de coisas. Afinal, é uma coisa incrivelmente complexa. Mas … todos podem começar a ajudar com algumas coisas… Más notícias primeiro: se pensaram que eu diria para pedalarem mais, comer menos carne, voar menos ou comprar coisas usadas, desculpem, não é tão simples assim. Mas aqui esta a boa notícia: vocês são mais que consumidores e compradores, mesmo que a indústria queira que se mantenham limitados a isso. Não! Nós somos todos seres políticos. E todos podemos fazer parte desta resposta. Podemos ser algo que muitos chamam de ativistas climáticos. Quais são os primeiros passos? Quatro primeiros passos essenciais para realizar todo o resto, que todos podem começar a dar, e que decidem sobre tudo o que pode acontecer depois.
Então, o que é isso?
Número um: nós precisamos reformular drasticamente nossa compreensão de quem pode ser a resposta para isso. Um ativista climático não é aquela pessoa que leu todos os estudos e agora está passando as tardes distribuindo folhetos sobre vegetarianismo em shopping centers. Não. Um ativista climático pode ser qualquer pessoa, todos os que querem se juntar a um movimento daqueles que pretendem envelhecer em um planeta que prioriza proteção de ambientes naturais e felicidade e saúde para muitos em vez da destruição do clima e do planeta para o benefício de alguns poucos. E como a crise climática está afetando cada parte de nossa vida política, social e privada, precisamos de ativistas climáticos em todos os cantos, não apenas em todos os cômodos, mas também em todas as cidades, países, estados e continentes.
Em segundo lugar: preciso que saiam da zona de conveniência, longe de tudo aquilo que diz: viva como se não houvesse um amanhã. Todos vocês aqui são um amigo ou um membro de família, um trabalhador, um colega, um aluno, um professor ou, em muitos casos, um eleitor. Tudo isso vem junto com uma responsabilidade que esta crise exige que você amadureça. Será que a empresa na qual trabalha ou que patrocina você está a caminho de cumprir o Acordo de Paris? Será que seu parlamentar sabe que você se importa com isso, e quer que isso seja uma prioridade em todas as eleições? O seu melhor amigo sabe sobre isso? Você lê jornal ou escreve para um? Ótimo! Diga a eles que você quer que relatem isso em todas as edições, e que desafiem os tomadores de decisão em todas as entrevistas. Se você é cantor, cante sobre isso, se é professor, ensine a respeito. E se tem uma conta bancária, diga ao banco que vai cancelá-la se continuarem investindo em combustíveis fósseis. E, claro, às sextas-feiras, sabem o que o que devem fazer.
Em terceiro lugar: sair dessa zona de conveniência funciona melhor quando vocês unem forças. Uma pessoa que pede mudanças inconvenientes é, na maior parte, inconveniente. Duas, cinco, dez, cem pessoas pedindo mudanças inconvenientes são difíceis de ignorar. Quanto mais vocês são, mais difícil fica para as pessoas justificarem um sistema que não tem futuro. O poder não é algo que você tem ou não tem. Poder é algo que você toma ou deixa para os outros, e cresce quando é compartilhado. Nós jovens nas ruas, estudantes grevistas, estamos mostrando como isso pode dar certo. Um estudante grevista sempre será apenas um único estudante grevista… bem, Greta Thunberg. Duas, cinco, dez, mil pessoas fazendo greve escolar é um movimento, e é disso que precisamos em todo lugar. Sem pressão.
E finalmente, em quarto lugar, e este é provavelmente o aspecto mais importante de tudo isso: preciso que comecem a se levar mais a sério. Se há uma coisa que aprendi durante sete meses organizando ação climática, é que se você não for atrás de algo, as chances são maiores de que ninguém mais irá. As instituições mais poderosas deste mundo não têm intenção de mudar o jogo que estão lucrando com a maioria, então não faz mais sentido depender deles. Isso é assustador, eu sei. É uma responsabilidade enorme, um fardo nos ombros de todos, sim. Mas isso também significa, se quisermos, que podemos ter algo a dizer sobre isso. Podemos fazer parte dessa mudança e da resposta. E isso é muito bonito, certo?
Então, vamos tentar, vamos botar pra quebrar, vamos inundar o mundo com ativistas climáticos. Vamos sair das zonas de conveniência unir forças e começar a nos levar mais a sério. Imaginem como seria este mundo, onde as crianças cresceriam sabendo que o futuro delas é uma grande aventura que podem esperar ansiosamente, sem nada a temer. Como seria este mundo quando a próxima conferência climática, esse grande acontecimento de pessoas que se reúnem, que ouviram a voz de milhões de pessoas, que arregaçariam as mangas, prontas para criar mudanças reais?
Sabem, sonho com um mundo onde as aulas de geografia ensinam sobre a crise climática. como um grande desafio que foi vencido por pessoas como vocês e eu, que começaram a agir a tempo porque entenderam que não tinham nada a perder e tudo a ganhar.
Então, por que não dar uma chance? Ninguém mais vai salvar o futuro para nós. Isso é mais do que um convite. Espalhem a ideia.
Obrigada.