MOMA contra Trump. Museu desafia a proibição de imigração expondo obras de artistas muçulmanos

 

Nas galerias do 5o andar do MOMA, Museu de Arte Moderna de Nova York – ao lado de trabalhos de Picasso, Matisse, Braque e outros luminares das artes plásticas, podem ser vistos agora várias obras de artistas muçulmanos oriundos dos países que estão na lista de proibições de Trump. Um gesto político decidido pela cúpula do Museu, que deverá ficar para sempre na história das artes

Por: Luis Pellegrini

Os Estados Unidos estão longe de ser o paraíso terrestre quando sonhamos com alguma utopia de país perfeito. Mas ninguém poderá negar à nação norte-americana, sobretudo às elites culturais e intelectuais do país, a capacidade de reagir prontamente a qualquer deslize de natureza impositiva e antidemocrática cometido por um dos seus líderes.

“O Profeta”, de Siah Armanjani, em exposição no Museu de bArte Moderna de Nova York. Foto: Sam Hodgson, do The New York Times

Há poucos dias, o Museu de Arte Moderna (MOMA), em Nova York, deu provas disso. A instituição, das mais importantes do mundo no gênero, tomou uma posição pública contra a ordem executiva do presidente Trump relacionada à política de imigração norte-americana. E fez isso sem declarações bombásticas, sem comunicados à imprensa, sem ruídos e alardes inúteis – sobretudo, sem os tweets que tanto agradam a Donald Trump. O MOMA escolheu um modo que não poderia ser mais elegante nem mais contundente: na noite da última quinta-feira, 30 de março, funcionários receberam ordem de remanejar as posições de boa parte das coleções permanentes do 5O andar – uma das alas mais prestigiadas do museu – para, nos lugares vagos, ocupar o espaço com obras de artistas muçulmanos. Uma decisão política que ficará para sempre na história das artes.

Meu pai e eu (My Father and I)” , de Charles Hossein Zenderoudi. Foto: Sam Hodgson, do The New York Times

Uma etiqueta política acompanha as obras

Quadros de Picasso, Matisse e Picabia, entre vários outros, foram substituídos por obras da arquiteta iraquiana Zaha Hadid, o pintor sudanês Ibrahim el-Salahi e vários artistas de origem iraniana, entre eles Tala Madani, Parviz Tanavoli e Marcos Grigorian.

O museu também instalou “O Profeta”, uma escultura do artista iraniano Siah Armajani no seu pátio do vestíbulo principal. Como se não bastasse, as obras são acompanhadas por etiquetas fixadas nas paredes que dizem: “Este trabalho foi realizado por um artista de uma nação a cujos cidadãos é negada a entrada nos Estados Unidos, de acordo com decreto presidencial emitido em 27 de janeiro de 2017. Esta é uma das obras de arte da coleção do Museu que foram instaladas nas galerias do 5o andar para afirmar os ideais de boas vindas e de liberdade tão vitais tanto para este Museu quanto para os Estados Unidos”.

A Mesquita (1964), de El Salahi

Expor e dar destaque aos artistas

Um grupo de importantes curadores de arte – Ann Temkin, Jodi Hauptman y Christophe Cherix – planejaram e desenvolveram a ideia desta nova instalação do MOMA durante o fim de semana (25 e 26 de março), quando mais de cem pessoas foram detidas em aeroportos norte-americanos e centenas de milhares se reuniram em manifestações de protesto contra a proibição de entrada no solo norte-americano de determinadas nacionalidades.

Expor e dar destaque aos artistas citados tem como objetivo, diz a direção do MOMA, ilustrar a história da influência transcultural na arte moderna e contemporânea. “É justamente no 5o andar do museu onde estão algumas das nossas obras mais importantes e queridas”, declarou Jodi Hauptman. “Pensamos que seria importante chamar a atenção para essas conexões”.

Caligrafia e arquitetura islâmica

Por exemplo, uma obra do artista iraniano Charles Hossein Zenderoudi, foi instalada em uma seção de obras de Henri Matisse. Ambos os artistas se inspiraram na caligrafia e na arquitetura islâmica. “Matisse estava muito interessado na arte do Islã, percebendo o quanto esse contato exercia um efeito transformador em sua própria produção de arte”, disse Hauptman.

Em outra galeria do MOMA, “A Mesquita” (1964) de El Salahi – uma das figuras mais importantes do modernismo africano – foi pendurado junto a obras de Picasso e Braque, que viam a arte africana como pioneira do cubismo no início do século 20. Todas essas obras são entendidas como “gestos de inclusão”, diz Hauptman: “Quando se proíbe a viagem e a comunicação, perde-se muito mais do que essas duas coisas. Este é um dos aspectos comoventes dos trabalhos que estão expostos nas nossas galerias. Se não existisse a possibilidade de viajar e de estabelecer pontes de comunicação entre culturas e raças, não teríamos estas coisas”.

O MOMA afirma não querer parar aí. Os curadores planejam integrar mais obras de artistas dos países afetados nas próximas semanas, quando várias galerias do 5o andar serão novamente abertas ao público depois dos trabalhos de remodelação em curso.

Vídeo: Imprensa norte-americana comenta a ação de protesto do MOMA.

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