Agrotóxicos. O veneno nosso de cada dia

 

O Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos. Seu uso em nosso país é “alarmante” e atinge cerca de 70% dos alimentos. Mais da metade das substâncias usadas aqui é proibida em países da UE e nos EUA

Por: Marina Rossi

Fontes: Jornal El País – Espanha e ANVISA

Imagine tomar um galão de cinco litros de veneno a cada ano. É o que os brasileiros consomem de agrotóxico anualmente, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA). “Os dados sobre o consumo dessas substâncias no Brasil são alarmantes”, disse Karen Friedrich, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

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Desde 2008, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos. Enquanto nos últimos dez anos o mercado mundial desse setor cresceu 93%, no Brasil, esse crescimento foi de 190%, de acordo com dados divulgados pela Anvisa. Segundo o Dossiê Abrasco – um alerta sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde, publicado nesta terça-feira no Rio de Janeiro, 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos. Desses, segundo a Anvisa, 28% contêm substâncias não autorizadas. “Isso sem contar os alimentos processados, que são feitos a partir de grãos geneticamente modificados e cheios dessas substâncias químicas”, diz Friederich. De acordo com ela, mais da metade dos agrotóxicos usados no Brasil hoje são banidos em países da União Europeia e nos Estados Unidos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nos países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam, anualmente, 70 mil intoxicações agudas e crônicas.

A maior parte dos alimentos consumidos pelos brasileiros está contaminada por pesticidas

A maior parte dos alimentos consumidos pelos brasileiros está contaminada por pesticidas

Uso está associado ao câncer e a alterações genéticas

O uso dessas substâncias está altamente associado à incidência de doenças como o câncer e outras disfunções genéticas. Por causa da gravidade do problema, o Ministério Público Federal enviou um documento à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendando que seja concluída com urgência a reavaliação toxicológica de uma substância chamada glifosato, produzida pela multinacional Monsanto, e que a agência determine o banimento desse herbicida no mercado nacional. Essa mesma substância foi associada ao surgimento de câncer, segundo um estudo publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) juntamente com o Inca e a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC). Ao mesmo tempo, o glifosato foi o ingrediente mais vendido em 2013 segundo dados do Ibama.

Pimentão, o campeão dos alimentos contaminados no Brasil.

Pimentão, o campeão dos alimentos contaminados no Brasil.

Em resposta ao pedido do Ministério Público, a Anvisa diz que em 2008 já havia determinado a reavaliação do uso do glifosato e outras substâncias, impulsionada pelas pesquisas que as associam à incidência de doenças na população. Em nota, a Agência diz que naquele ano firmou um contrato com a Fiocruz para elaborar as notas técnicas para cada um dos ingredientes – 14, no total. A partir dessas notas, foi estabelecida uma ordem de análise dos ingredientes “de acordo com os indícios de toxicidade apontados pela Fiocruz e conforme a capacidade técnica da Agência”.

Fabricantes querem esgotar os estoques

Enquanto isso, essas substâncias são vendidas e usadas livremente no Brasil. O 24D, por exemplo, é um dos ingredientes do chamado ‘agente laranja’, que foi pulverizado pelos Estados Unidos durante a Guerra do Vietnã, e que deixou sequelas em uma geração de crianças que, ainda hoje, nascem deformadas, sem braços e pernas. Essa substância tem seu uso permitido no Brasil e está sendo reavaliada pela Anvisa desde 2006. Ou seja, faz quase dez anos que ela está em análise inconclusa.

Avião joga pesticidas sobre lavoura de milho

Avião joga pesticidas sobre lavoura de milho

O que a Justiça pede é que os ingredientes que estejam sendo revistos tenham o seu uso e comércio suspensos até que os estudos sejam concluídos. Mas, embora comprovadamente perigosos, existe uma barreira forte que protege a suspensão do uso dessas substâncias no Brasil. “O apelo econômico no Brasil é muito grande”, diz Friedrich. “Há uma pressão muito forte da bancada ruralista e da indústria do agrotóxico também”. Fontes no Ministério Público disseram ao EL PAÍS que, ainda que a Justiça determine a suspensão desses ingredientes, eles só saem de circulação depois que os fabricantes esgotam os estoques.

ANVISA SOLTA LISTA DOS ALIMENTOS MAIS CONTAMINADOS

Batata foi o único vegetal que não apresentou nenhum lote infectado

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou uma lista que mostra quais os alimentos mais contaminados no país. Segundo a divulgação, cerca de um terço dos vegetais mais consumidos no Brasil apresentaram um nível de agrotóxico acima do aceitável.

Foram analisadas quase 2.500 amostras de 18 tipos de alimentos pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos de Alimentos, da Agência. Entre os critérios do levantamento estavam a análise da presença de agrotóxicos acima do nível permitido e a presença de agrotóxicos não autorizados para o tipo de alimento.

A batata foi o único vegetal examinado que não apresentou nenhum lote contaminado. Em compensação, praticamente todas (91,8%) as amostras de pimentão apresentavam agrotóxicos acima do permitido. Morango, pepino e alface também estavam entre os itens mais contaminados, apresentando irregularidades em mais de 50% dos lotes examinados.

Confira os resultados do levantamento:

 

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